Oitenta artistas
surdos, cegos e autistas, a maioria deles crianças. sobem ao palco do
Teatro Feluma, em Belo Horizonte, no dia 23 de novembro, para apresentar o
espetáculo “Somos Todos Diferentes”. A
apresentação, com entrada gratuita, será aberta por 40 artistas, entre
eles crianças, jovens e adultos com deficiência, alunos de
violão do músico Wéberty Marliére, criador de método exclusivo para ensinar a
esse público. Eles irão apresentar nove músicas. Em seguida, 40 bailarinas e
bailarinos com deficiência subirão ao palco.
Apresentação dos violões
O espetáculo faz
parte do projeto Céu e Terra, que oferece aulas gratuitas de balé e música para
crianças, jovens e adultos com ou sem deficiência, criado há 28 anos por
Wilmara Marliére para promover a
inclusão por meio da arte. Este é o maior espetáculo da história do
projeto, que culminará com todos os artistas no palco.
Wilmara Marliére ( foto Lídia Marques)
A apresentação
marca o retorno de Wilmara aos palcos após um hiato de seis anos, motivado por
complicações de saúde. A bailarina é portadora da Síndrome de Arnold-Chiari,
uma doença rara que compromete a audição e o equilíbrio devido a uma
malformação no crânio. Sua própria trajetória de superação foi o que a inspirou
a criar o projeto Céu e Terra.
foto:Lídia Marques
Segundo Wilmara, o
objetivo do projeto é desenvolver a autoestima e a sensação de capacidade, além
de estimular a fala, a audição (por meio das vibrações musicais) e a expressão
corporal. A proposta também visa incentivar a comunicação e o respeito mútuo
entre pessoas com e sem deficiência.
Apresentação de Wilmara ( foto Lídia Marques)
História de
superação - Nascida no interior
de Minas Gerais, Wilmara conta que descobriu a paixão pela dança ainda na
infância. Como sua cidade não possuía escola de balé e a família não tinha
condições financeiras para custear estudos fora, ela se inspirava nas
apresentações que via na televisão. “Imitava os bailarinos. Cheguei a
improvisar sapatilhas usando pedaços de bambu para fazer a ponta”, relembra.
Anos depois, já
morando em Belo Horizonte com a irmã Meiry de Paula — que também é bailarina e
atualmente faz parte do projeto —, Wilmara começou a frequentar escolas de
dança. Mesmo iniciando os estudos já adulta, alcançou rapidamente níveis
avançados. Foi nessa época que, após episódios recorrentes de enxaqueca,
recebeu, aos 28 anos, o diagnóstico da Síndrome de Arnold-Chiari.
A perda auditiva
causada pela doença motivou Wilmara a fazer um estágio no extinto Instituto
Santa Inês, referência em educação de surdos. A experiência a sensibilizou
profundamente. A partir daí, mergulhou em leituras sobre surdez, participou de
eventos na área da saúde e, por iniciativa própria, começou a dar aulas de balé
para crianças surdas na sala de sua própria casa. Assim nasceu o projeto Céu e
Terra.
Começando com
apenas oito alunos, o trabalho chamou a atenção da mídia, o que levou o diretor
do Colégio Arnaldo a oferecer uma sala para o projeto — espaço onde funciona
até hoje, na capital mineira, atendendo centenas de crianças ao longo dos anos.
“Desde a primeira
turma, os exames mostraram melhora na audição das crianças”, afirma. Em 2001,
as aulas de música foram integradas ao projeto pelo marido, Wéberty, que dá
aulas de violão para alunos cegos, com idades entre 7 e 80 anos. Mais
recentemente, o projeto passou também a atender crianças com autismo de grau 1
nas turmas de balé.
Além do marido,
Wilmara tem como aliadas no projeto a irmã, a bailarina Meyre de Paula, e a
filha, Maria Clara. “Sem eles não teria tanta força para seguir”, declara.
O Projeto Céu e
Terra conta com o apoio do Colégio Arnaldo há 28 anos e neste ano tem o
patrocínio da Supermix e Hexagon por meio da Lei Rouanet.
Arte é poderosa
ferramenta - Para Wilmara, ainda
há muitos preconceitos a serem superados, e a arte é uma poderosa ferramenta
para mostrar a capacidade das crianças com deficiência. “Lembro de uma mãe que
chegou com duas filhas, uma delas surda. Ela disse que não esperava grandes resultados
da filha com deficiência. Mas aconteceu o contrário: foi ela quem mais se
desenvolveu e acabou se tornando a solista do espetáculo. Essas crianças têm
uma capacidade de atenção extraordinária”, conta.
Desde o diagnóstico
da síndrome, Wilmara passou por diversas cirurgias na coluna cervical, chegou a
ficar sem andar e ouviu dos médicos que nunca mais voltaria a dançar. No
entanto, a determinação e o amor pela dança a fizeram seguir em frente. Em
2020, sequelas da Covid-19 impediram seu retorno aos palcos. Agora, após várias
sessões de fisioterapia, ela promete uma apresentação especial no espetáculo deste ano.
No palco do Teatro
Feluma, Wilmara vai dançar “A Morte do Cisne”, solo clássico criado em 1905
pelo coreógrafo russo Mikhail Fokine. “É o meu balé preferido e estarei no
palco, o lugar que mais amo”, afirma, emocionada.
Espetáculo “Somos
todos diferentes”
Data: 23 de
Novembro, domingo
Horário: 19h00
Local: TEATRO
Feluma Prof. Dr. Geraldo Magela Gomes da Cruz - Alameda Ezequiel Dias, 275 -
Sétimo Andar - Centro, Belo Horizonte - Minas Gerais